Indústria de Jogos

As Tretas da Treta

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As Tretas da Treta

Primeiramente, gostaria de deixar claro que para mim e para minha equipe é uma honra estrearmos essa nova área aqui do IDJ. Meu nome é Wagner Tamborin, mas podem me chamar de “Bag” (aqueles típicos apelidos que você ganha na faculdade e ficam). Sou ilustrador e co-founder da 2Dverse Studio, empresa paranaense de desenvolvimento de jogos e entretenimento digital. Quando o Malegra me ofereceu esse espaço para dissertar sobre algumas coisas, as ideias já começaram a vir em mente, aí eu pensei: “poxa, apenas 3 anos na área e eu já tenho MUITA coisa para contar...” e isso é fantástico, tantas coisas e histórias que nossa área nos proporciona. E é com esse pensamento que venho aqui hoje lhes contar apenas algumas. Afinal, de onde que surgimos, e por que diabos nosso primeiro projeto é um projeto em parceria com os Irmãos Piologo?

Equipe 2DVerse

Tudo começou quando nos conhecemos na universidade, em 2012. Todos os 3 fundadores da empresa (Eu, Marcelo Garbelotti e Felipe Bonfante) são da mesma turma de Engenharia de Computação, da UTFPR Campus Cornélio Procópio (um buraquinho de mundo que fica perto de Londrina). Até então ninguém tinha em mente o que estaríamos fazendo hoje. Ambos tinham fascínio (e ainda têm) por jogos desde pequenos, isso é fato. Mas trabalhar na construção deles? Jamais. Essa ideia começou a ascender quando vimos que na universidade tinha um laboratório de desenvolvimento de jogos, onde alguns alunos poderiam entrar e experimentar um pouco de desenvolvimento. Entramos! “Vamos ver o que é isso aqui! ”. A partir de lá começamos a trabalhar em projetos, não lucrativos, apenas para estudo mesmo. Entrei na área de arte, pois eu amo desenhar desde que me entendo por gente. Ganhamos um pouquinho de experiência, ou pelo menos conhecemos como é trabalhar no desenvolvimento em si de um jogo. Ficamos lá por mais ou menos 1 ano e meio, criando, tendo ideias, conhecendo pessoas, e claro, engavetando ideias que mal saíram do papel, afinal, que estrutura tínhamos para botar a cara no mercado nessa altura do campeonato? Ainda assim, eu e mais dois amigos conseguimos finalizar um dos projetos que tínhamos e lançá-lo na Play Store, o “Jelly Tale”, um jogo de plataforma onde o personagem principal é uma jujuba vermelha (isso mesmo haha). Foi nosso primeiro contato com o mercado, e também o primeiro contato de feedbacks de pessoas diferentes.

No fim de 2013, conhecemos Anderson Fernandes, mais conhecido como “Burnes”. Ele coincidentemente era CEO da loja virtual do Mundo Canibal. E foi a partir dessa amizade que a ideia surgiu. Os Irmãos Piologo estavam entrando pesado no ramo dos games, com o início do ótimo “Apocalypse: Acabou a Putaria”, feito pela IzyPlay, lançado um tempinho depois. Estávamos eufóricos em tentar algo com eles, Anderson era nossa ponte, e deu certo! Fizemos uma reunião de apresentação, conde conhecemos Ricardo e Rodrigo. Não sei descrever o quão bacana são esses dois caras. Eles abraçaram a ideia, viram que estávamos dispostos a dar tudo que tínhamos para esse projeto sair, e assim foi feito. Mas não tão felizmente assim... Ocorreram algumas coisas entre o início e o lançamento da “A Treta dos irmãos Piologo”, e eu vou contar apenas o mais “relevante”, se é que podemos chamar assim.

Ok, ideia aprovada, era hora de botar a mão na massa para valer! E foi aí, logo no comecinho de 2014, que a 2Dverse surgiu. Entramos na Incubadora de Inovações Tecnológicas da UTFPR-CP, onde tivemos e temos até hoje um excepcional suporte. Eu, Marcelo, Felipe e um quarto integrante que irei chamar de “carinha”. Passamos as férias todas trabalhando em uma versão alpha de um jogo chamado “Rodrigo VS Canibal World”. A ideia desde o começo foi do Burnes, queríamos fazer algo diferente para os Piologo, e colocar ELES dentro do jogo, e não seus personagens. E assim foi feito. Trabalhamos nessa versão alpha até abril de 2014, mais ou menos. Foi quando houve um evento na UTFPR, o “UTFGames 2014”, onde os Piologo viriam para dar uma palestra. Foi nossa primeira reunião presencial, onde mostramos para eles o resultado do que estávamos fazendo dessa primeira versão. Eles curtiram, ou pelo menos nos fizeram acreditar haha. Depois que eles foram embora e voltamos a nos sentar para dar continuidade no projeto, vimos que o que tínhamos feito estava vergonhoso (estou sendo bonzinho ainda). Jogamos tudo fora. A versão, os desenhos, o nome... realmente tinha ficado muito ruim. Começamos do zero novamente, pegamos os feedbacks construtivos que os irmãos nos deram, e resolvemos fazer novamente.

Imagem da primeira versão

Tivemos a brilhante ideia (ironia) de fazer essa versão em pixel art. Agora parem e pensem um pouco: apenas 2 artistas na equipe, todos estudantes em tempo integral, e ninguém com grana para contratar mão de obra. Quem trabalha com pixel art sabe o quão trabalhoso e demorado é, e nós realmente achamos que isso ia dar certo. Deu até um certo ponto, pois até saíram algumas coisas! Um alpha dessa versão também saiu, muito melhor do que o da primeira versão, mas ainda assim, nada comparado do que queríamos para o projeto.

Algo peculiar ocorria em paralelo a esse tempo de desenvolvimento da segunda versão. Estávamos em contato com a Hoplon, Publisher do Apocalypse. Estávamos recebendo alguns feedbacks, e teríamos ajuda para com o projeto na questão de publicação e feedback na parte do desenvolvimento. O que não ocorreu, devido a coisas que não queremos expor aqui.

Essa segunda versão do jogo também teve o mesmo destino da primeira, por diversos fatores. Equipe pequena demais, falta de tempo, e muita, mas MUITA falta do mais importante: documentação. Até o momento não tínhamos nada documentado, não tínhamos GDD, não tínhamos sequer uma folhinha rabiscada de onde tínhamos que partir, por onde passar e onde queríamos chegar com o projeto. E esse, foi o nosso maior erro, e eu vou explicar brevemente o porquê do ocorrido.

Segunda versão do game

Vimos que não ia dar certo, e jogamos tudo fora novamente. Começamos do zero uma versão nova que já tinha mais ou menos a cara (visualmente falando) do que temos hoje lançado. Foi aí que “A Treta dos Irmãos Piologo” começou a dar as caras.

Fizemos tudo do zero de novo (ô sofrência), e tínhamos decidido que agora era “agora ou nunca”. Fizemos o que tinha que ser feito, e o jogo começou a tomar os rumos que queríamos desde o início. No fim do primeiro alpha, sentimos uma tremenda satisfação em ver o quanto evoluímos desde a primeira versão, e isso nos motivou mais ainda a terminar.

Tivemos a chance de ir e expor na Brasil Game Show de 2015. Levamos uma versão beta do que tínhamos, e o feedback foi melhor do que esperávamos. Podíamos sentir, de verdade, que tínhamos algo em potencial em mãos, principalmente pelo feedback que os Irmãos Piologo nos davam sobre a nova versão. Ficou claro que eles torciam para que evoluíssemos como evoluímos, e eu entendo e agradeço muito por isso.

A galera jogou na BGS, tivemos um grande feedback positivo, demos entrevistas, enfim, botamos nossa cara na mídia. Agora não tinha mais volta, ou lançávamos o projeto, ou a empresa morria. Fizemos uma rede maravilhosa de amigos na Brasil Game Show, que lugar fantástico! Saímos do buraquinho de onde somos e vimos que não era apenas nós que passamos por mal bocados para desenvolver.

Voltando, sentamos e avaliamos o feedback, e aí que começa o ápice da pior parte dessa treta toda. O jogo estava bacana, polido, bonito, engraçado, mas a jogabilidade não estava ajudando. Tínhamos em mão um jogo de exploração, parado, sem vida... não era isso que queríamos, e essa BGS coube como uma luva para notarmos isso. Queríamos algo frenético, linear, com ação, explosões, tiros, e tudo mais o que a molecada de hoje em dia se empolga e enche os olhos ao jogar um jogo. Vimos que ainda tínhamos um belo trabalho pela frente até lançar o jogo. O que temos hoje é uma quarta versão, que pegou apenas o “esqueleto” da terceira para ser retrabalhado na parte de jogabilidade.

Versão final

Estávamos em quatro pessoas: um artista (eu), Felipe na animação, Marcelo na programação e o carinha no Game Design(ou pelo menos era isso que ele deveria ter feito). O projeto era grande, e a equipe pequena, não podíamos dar ao luxo de nos preocupar com a função do outro, pois já estávamos fazendo a nossa e muito mais (todos sabemos que um projeto vai muito além de apenas programar e desenhar). Todas essas sub-tarefas cujo não tínhamos alguém exclusivamente para isso, tivemos que dividir entre si e aguentar as pontas. Isso nos forçou a confiar muito mais no trabalho do outro, e esse, acredito eu, foi o nosso maior erro esse tempo todo.

Nesse momento final, percebemos que nosso maior erro, desde o início, foi Game Design. Mencionei ali em cima que naquela etapa não tínhamos nenhuma documentação, certo? Pois é, ainda não tínhamos nesse momento também. Foi quando resolvemos criar uma “força tarefa” para infelizmente refazer o trabalho do carinha, e tirá-lo da equipe. Ele se distanciou quando mais precisávamos, provavelmente viu a avalanche que criou desde o primeiro momento em que ficou encarregado de cuidar dessa parte do projeto. Mas vamos parar por aqui, não quero crucificar ninguém, mas um projeto que teve 3 versões jogadas fora, com duração de mais de 2 anos precisa de pelo menos uma justificativa por ter sido assim, certo?

Depois de muita treta interna, a “A Treta dos Irmãos Piologo” começou a dar suas caras, finalmente. Agora já tínhamos boa parte da documentação, tínhamos level designs descritos, mecânicas polidas, enfim, tínhamos o que queríamos exatamente desde a primeira versão em 2013, e finalmente, tínhamos um JOGO! Trabalhamos MUITO, em três pessoas, nesses últimos nove meses para lançá-lo na BGS deste ano. Mas vocês acham que a treta acabou aí? É claro que não... Arrumando as malas para ir pra BGS, recebemos um e-mail da Google Play dizendo que nosso jogo tinha sido suspenso por conter “Conteúdos Impróprios”. Fomos pra BGS sem saber o que fazer. Mas chegando lá conseguimos contornar a situação e ocorreu tudo como planejado. UFA!

Após muito café, estresse e quase desistência, conseguimos finalizar o que temos hoje disponível na Play Store. É óbvio que o trabalho não termina por aqui. Jogo é que nem filho... não adianta ele fazer 18 anos, sempre vai dar trabalho. Hoje já estamos com novos projetos em execução, a empresa está expandindo, já somos 10 pessoas! E queremos cada vez mais, pois temos loucura e vontade necessárias para ir cada vez mais longe!

Baixe Já!

E esse foi um pequeno trecho da baita história que acumulamos e experiência que tivemos nesses últimos três anos. Não dá para medir o quanto evoluímos. Se fôssemos fazer uma analogia, começamos no Level 1 e upamos até o 20, mais ou menos, em um curto espaço tempo, até parecemos aqueles que compram cash (nada contra! Hahaha). Não foi fácil para três leigos (acho que já podemos nos considerar ex-leigos, né?) botar a cara no mercado assim, com um projeto tão grande, e mais ainda, com uma baita responsabilidade de carregar uma marca tão grande e tradicional como a dos Irmãos Piologo. Nunca teremos palavras o suficiente para expressar a gratidão que temos para com eles, de nos ter confiado seu legado. E claro, temos muitas outras pessoas a agradecer nesse meio tempo, mas não quero me estender, já escrevi demais! Até tenho dúvidas se alguém ainda está lendo, acho que a maioria desistiu quando comecei a falar da segunda versão hahaha. Enfim, agradeço demais o espaço que tivemos aqui. O trabalho continua, e o aprendizado é gigante! É por isso que eu amo o que eu faço, você nunca vai ter aprendido o suficiente, e se você acha que é melhor que alguém em alguma coisa por achar que já sabe tudo, cai fora que esse mercado não tem espaço para você não! Um grande abraço meu e de toda a equipe da 2Dverse Studio. E baixem a Treta, tá de graça!


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Sobre o Autor

14191932_1183428511713618_4231951875177926994_nWagner Janelli Tamborin (aka Bág) é sócio e diretor de arte do estúdio de games Paranaense 2Dverse.    

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Mauricio Alegretti

Mauricio Alegretti ("Malegra") é o fundador do site e comunidade Indústria de Jogos. Cria jogos digitais por paixão e profissão há mais de três décadas, que foram publicados em diversas plataformas e consoles. Foi diretor das associações Abragames, IGDA e Acigames, co-fundou e dirigiu o estúdio Smyowl e a comunidade Portalxbox, foi Microsoft MVP em Xbox e Kinect, e hoje é CTO na Ortiz Gaming, uma multinacional no setor de jogos para cassinos.